sábado, 25 de outubro de 2014

Morosofia

Explorei neste mundo dimensões extras:
A tulipa cresce na cabeça do louco
A tulipa é o segundo coração do artista
Tenho, desvairado, tulipas demais e tenho miolos de menos.

Sou um tradutor de absurdos
Delirante por vocação.

No eclipse encontra-se o sol co’a lua
E quem desaparece sou eu
Minha sombra projeta a noite no céu.

À vida ardente nos continentes, oceanos e fábulas!
Um louvor aos loucos que dançam bêbados ao meio-dia!

Tenho-me visto dormir à deriva
Passeado sonâmbulo pelos bares
Pedindo inspiração pra beber.

No dia seguinte acordo entre cinzeiros vazios
Cinzas e bitucas pelo chão
Garrafas, às dezenas, bebidas pela metade.

E meus sonhos me transbordam.


(Thiago Nelsis)

terça-feira, 21 de outubro de 2014

A Cidade

Sonhei-me congelado além da vida
Jazido sob o pé da estátua de olhar calado

Já no entardecer toda vida desaparecera
Eu permaneci até a manhã seguinte
E vi crescer a estátua de maneira assombrosa

Ante os olhos do monumento a vida é indiferente
Fora tudo fulminado perante sua beleza pétrea.

Vi lá fora o vazio do tempo
Nada além do meu passar despreocupado
Outrora, sonhando por entre as ruas
Povoei-as da vida que inflamava o cenário.

Mas que vazio sou eu enfim
Projetado em cidade-fantasma!
Fantasmei-me em meu pesar por tudo afora...
Sonho agora o silêncio que canta nas esquinas.

- Perambulante, vai vagando
Que é penoso o despertar.
- Perambulante, bebe o sonho
Deste teu existir imortal.

A ideia dança a vida no poema entre as linhas da folha
Deformo a ideia na quebra
                                            da linha.
Limito o sonho no ponto e vírgula.

Pousou um pássaro nas minhas sinapses
Enredou-se na teia neural que tecia o poema.

E eu me esqueci de tudo.

(Thiago Nelsis)


terça-feira, 26 de agosto de 2014

Depois do Espetáculo



Depois do espetáculo desfaleci
no pé do rio que separa os mundos.

A aurora rubra irradia o cenatório
que me acolhe; sinto ainda pesados
os meus membros já dormentes...
(Ah!) – essa vitalidade que inflama em mim,
pulsante,
mesmo neste espástico cansaço!
Fervente o corpo
como eu já não o sabia sentir... enfim!

Carruagens correndo sobre a ponte
cantam à chegada da visita!
Carruagens correm loucas na ilusão!
Carruagens... (sobre a ponte!)

Brilho dourado das nuvens de fúria
– que percorrem os montes –
nas colinas onde o brado ressoa...

Escolhi desfalecer à beira deste rio
para ouvir
as carruagens da loucura.

(...) Ilusão de vida e morte.

Eu separo dos rios o mundo:
e meu brado translúcido ressoa!
A ponte corre dourada
sobre as gramas da colina rubra
(vão-se as carruagens ante o crepúsculo)!...

Ah, sim!
Para mim veio a mais bela das loucuras:

está na ponte entre as carruagens rubras
que separam os mundos:
nas colinas do rio dourado – que brada
sobre a grama translúcida e ressoa o crepúsculo...

carruagens distantes...
loucura disforme...

(Crepúsculo dos mundos):
as carruagens me separam!
a grama corre o rio translúcido
nas colinas douradas
em que brada a grama sobre a ponte cansada...

Carruagens disformes
da loucura e do delírio...
O cenatório dormente inflama
no cansaço espasmos ferventes!
A vitalidade sentida nos membros acolhedores...
pesada aurora!
– Sinto espasmos que já não mais sabia.

Desfaleci no espetáculo do rio;
após as carruagens que percorrem as colinas
(cantando loucuras da grama e da ponte):
dois mundos dormentes.

O peso translúcido do crepúsculo dourado,
da rubra aurora da loucura
(espasmos de vitalidade translúcida...)
e do espetáculo acolhedor.

Ah! meu Devaneio, meu Paraíso!

(Thiago Nelsis)

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Soneto Mágico



Deposta a mente dos sentidos: vê!
– Triunfante a Unidade se desvela
No universo (que paira sobre a tela
Diante do olho desencarnado). Sê,

Logo, a incompreensão refigurada.
Tudo que existe é exposto na ultravida...
A clareza – que oculta na cortina –
Saúda tua memória espedaçada!

Acorda, homem-miserável! Sai
Do flagelo que é crer nessa existência!
Tua forma contingente já se vai...

Não ficará rastro de tua vivência.
Humanidade... tolos como foram:
Mortos, nunca saberão que viveram!

(Thiago Nelsis)

Insomnia



Albergado na ignomínia do ser
Se instala o patife abutre a roer
Da derme as nossas sensações adustas,
E mastigando o intangível degusta

O dissabor donoso do existir...
Engasga-se; bico podre a fremir
As penas de sua contaminação:
Desaparece c’o doente a aflição

Como é pra ser co’a desgraça na vida.
Inditoso o ser humano – não passa
Da iguaria que os vermes comem fria.

Na poça o meu reflexo merencório,
(Este sonambulismo nunca acaba!)
Madrugada! – Meu limbo-purgatório...


(Thiago Nelsis)

sábado, 23 de agosto de 2014

Resenha de Brinde Noturno & outros poemas no site Trecho de Livros

"Já que estou me confessando preciso dizer que inspirado por três poetas: Vinícius de Moraes que conheci na minha adolescência. Depois Leminski que conheci assim que adentrei no mundo virtual. Por último me apaixonei por Fernando Pessoa que tive a honra de analisar, na faculdade, algumas de suas facetas (Caeiro, Reis, Campos). Continuo inspirado pelos três e agora por Thiago Nelsis, com essa obra."

(Wellington Rafael)


http://trechosdelivros.com/resenha-literaria-brinde-noturno-outros-poemas-de-thiago-nelsis



quinta-feira, 17 de julho de 2014

O Espelho

Eu quero me afogar num piso úmido!
Partir dum nada transformado em tudo,
levar minhas cinzas ao sabor do vento...

Com temor e desalento
gargalhar dos meus fracassos
(dói-me a cabeça, os pés e os braços).

Rir, talvez,
ao transbordar meu sangue sujo.
E quem sabe eu
– cria do meu próprio desalento –,
ao engolir com esse sangue e pedras,
todo o nojo que, ao sentir, me afoga...

Não serei nada e assim serei:
entre os seres o maldito,
amante mor do desperdício.

Diante do espelho no qual
minha alma se deformou.

(Escrito por Thiago Nelsis e Henry Rios)

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Vidas



Igualmente são reais a vida e o sonho
– mas tão melhor é o sonho:
pouca memória se guarda do sonho
(na vida o tempo é linear!);
na vida é tudo irretratável!

Fui novamente criança
num sonho sonhado ontem:
– hoje estou aqui e tenho 30.

Tendo dormido à tarde,
viajei afora pelo cosmos:
– hoje estou aqui e tenho 30...

Quisera agora poder dormir
um dia inteiro, a vida toda:
– mas hoje estou aqui e tenho 30!

Estaria como estou agora, se sonhasse.
Sonharia (depois) que nada disso se passou;
estar ou não estar,
SER, e que seja lá eu o que for!
irrevogavelmente até o final (...)

O poder deslocar-se livre entre os instantes, ...
(estar vivo é andar na prancha)
todo o tempo que corre é andar na prancha.

(Sempre) atrás de mim: – acumulam-se os antes...
(Sempre) à minha frente: – escassam-se os depois...
Mas hoje estou aqui e tenho 30!

se tiver tempo, terei 31...
e menos que isso, nunca mais.

Ser sapiente é estar louco, mas com razão:
(estar desperto é crescer
numa prisão minguante.)

e se eu partir cedo demais,
é que a vida me tardou.


(Thiago Nelsis)