Reviramo-nos sob nossos túmulos.
Dissipados, meus pensamentos vagueiam
sem ter paz...
Tua sedução aniquilara-me outrora.
Eis que renasço então!
Relembro:
Viajávamos na névoa da noite;
Sob sóis ardentes...
Entre feitiços sutis, entre miragens,
Nossa avidez e danação! Insaciáveis,
marchávamos!
Fomos como deuses perambulando entre
os porcos:
Derramamos nosso veneno na superfície
do mundo,
Avançamos com duras botas de ferro, a
esmagar o solo.
Os ídolos, destronados
Sob sóis ardentes...
Entre feitiços sutis e entre miragens,
...
O banquete servido na sala vazia,
À espera de quem nunca vai voltar...
Sob o Universo imenso, submergimos.
Em tempos ainda mais antigos
eu teria espalhado a tempestade pelo
mundo inteiro.
Tivesse feito subir os vapores mortais
do ventre da Terra:
dissera aos mortos que invocassem seus
vivos,
que lhes devolvessem o nada que
perderam
e de que não se lembram mais.
Chorei cada nascimento e,
incapaz de tanto terror,
escolhi putrefar junto à gente
ordinária
que viveu e que morreu.
Dei aos bichos minhas carnes,
matei e morri.
Fiz-me bruto e ensinei aos melhores
homens
as mais detestáveis carnificinas.
E hoje, imitando dos mortais a morte,
nesta fria sepultura em que prometi
ser-lhes igual,
estremeço consciente de minha própria
lucidez.
Rogo-te então:
Guarda por favor o teu chamado
sob a poeira e sob o vento!
Deixa-me desvanecer
com os corpos que deitei sob a terra,
ainda que esta terra não me queira
engolir.
Perdoa-me, Eternidade!
Irmã traída do imortal que te renegou,
Sob sóis ardentes...
Entre feitiços sutis! entre miragens!
(Thiago Nelsis)