quinta-feira, 17 de julho de 2014

O Espelho

Eu quero me afogar num piso úmido!
Partir dum nada transformado em tudo,
levar minhas cinzas ao sabor do vento...

Com temor e desalento
gargalhar dos meus fracassos
(dói-me a cabeça, os pés e os braços).

Rir, talvez,
ao transbordar meu sangue sujo.
E quem sabe eu
– cria do meu próprio desalento –,
ao engolir com esse sangue e pedras,
todo o nojo que, ao sentir, me afoga...

Não serei nada e assim serei:
entre os seres o maldito,
amante mor do desperdício.

Diante do espelho no qual
minha alma se deformou.

(Escrito por Thiago Nelsis e Henry Rios)

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Vidas



Igualmente são reais a vida e o sonho
– mas tão melhor é o sonho:
pouca memória se guarda do sonho
(na vida o tempo é linear!);
na vida é tudo irretratável!

Fui novamente criança
num sonho sonhado ontem:
– hoje estou aqui e tenho 30.

Tendo dormido à tarde,
viajei afora pelo cosmos:
– hoje estou aqui e tenho 30...

Quisera agora poder dormir
um dia inteiro, a vida toda:
– mas hoje estou aqui e tenho 30!

Estaria como estou agora, se sonhasse.
Sonharia (depois) que nada disso se passou;
estar ou não estar,
SER, e que seja lá eu o que for!
irrevogavelmente até o final (...)

O poder deslocar-se livre entre os instantes, ...
(estar vivo é andar na prancha)
todo o tempo que corre é andar na prancha.

(Sempre) atrás de mim: – acumulam-se os antes...
(Sempre) à minha frente: – escassam-se os depois...
Mas hoje estou aqui e tenho 30!

se tiver tempo, terei 31...
e menos que isso, nunca mais.

Ser sapiente é estar louco, mas com razão:
(estar desperto é crescer
numa prisão minguante.)

e se eu partir cedo demais,
é que a vida me tardou.


(Thiago Nelsis)